Textos de História

segunda-feira, julho 17, 2006

A Crise de 1929

Início da década de 1910. A Europa é responsável por boa parte da produção industrial do mundo. Os produtos industrializados europeus, além de serem consumidos por eles próprios, também são vendidos para praticamente todos os países do planeta. Na Argentina, por exemplo, a Empresa Textil de Buenos Aires importa peças de roupa de uma indústria inglesa, e as revende na região de Buenos Aires.

Na época, meu bisavô era dono de uma indústria de tecidos chamada Thompson & Rockmore American Fabric Industry. O Thompson era de meu bisavô, Charles Thompson, um viciado em café. Joseph Rockmore era um antigo amigo seu. A T&R — cuja fábrica, com 5 funcionários, ficava em Nova York — vendia peças de tecido para uma outra fábrica, a John Hill Wearing Company, também em Nova York, que os transformava em calças, camisas, vestidos e cobertores.

Em 1914, a empresa de meu bisavô vendeu 20.000 peças de tecido à JH, que as transformou em 20.000 peças de roupa. Antes do começo da Primeira Guerra, os únicos compradores dos produtos eram os próprios nova-iorquinos. No ano seguinte, porém, as coisas começariam a mudar.

Com a guerra, as indústrias européias estavam destruídas. Os europeus não tinham como produzir, e consequentemente não tinham o que vender para os outros países. Ou seja, se a Europa não produzia mais roupas, a Empresa Textil de Buenos Aires (ETBA) não tinha o que vender. A solução, tanto para a Europa quanto para os outros países, era importar. Dos Estados Unidos.

Além de vender para os nova-iorquinos, a JH começou a vender também para os europeus e para empresas de outros países, entre elas a ETBA. Já em 1915, produção da JH dobrou para 40.000 peças. Para conseguir produzir tanto, a JH teve de contratar mais funcionários. Óbviamente, tinha também de ter mais peças de tecido, para transformá-las em roupas. Assim, passoua comprar 40.000 peças de tecido da T&R, que também teve de aumentar o número de trabalhadores para dar conta da produção.

Ano após ano, havia cada vez mais países comprando produtos das indústrias americanas. Para dar conta de tantos pedidos, as indústrias contratavam mais funcionários e aumentavam seus salários. Ou seja, a cada ano aumentava o número de americanos empregados, com salários cada vez maiores. Com bastante dinheiro para gastar, os americanos passaram a consumir mais. Assim, começava um ciclo que se repetiria durante o fim da década de 1910 e toda a década de 1920:

  • Se os americanos compravam mais produtos, a produção teria de aumentar.
  • Aumentanto a produção, aumentava também o número de trabalhadores e seus salários.
  • Mais ricos, eles compravam ainda mais, fazendo a produção aumentar novamente.

  • A guerra havia acabado em 1918. Em 1921, países europeus como Inglaterra e França retomaram o crescimento. Ainda assim, a expansão econômica dos Estados Unidos era muito maior. "Distraídos" pela festa que foram os anos 20, os americanos não perceberam que um dia isso teria um fim.

    Ao longo da década de 1920, a Europa foi recuperando sua capacidade produtiva. As exportações dos Estados Unidos para a Europa diminuíam ano a ano. Além disso, os produtos europeus passaram a competir com os produtos americanos no mercado internacional. A Empresa Textil de Buenos Aires parou de comprar roupas da JH e voltou a importar da indústria inglesa.

    As indústriam achavam que, mesmo parando de vender para a Europa e para outros países, não seria necessário diminuir a produção, pois o consumo interno aumentaria. De fato, o consumo dos americanos era cada vez maior. Mas, aos poucos, começou a sobrar produtos nos estoques. As indústrias estavam saturadas. A quantidade de produtos era maior que a quantidade de compradores. Em outras palavras, a oferta era maior que a procura. Com isso, os preços dos produtos despencaram, e as empresas começaram a ter prejuízos. Para diminuir os gastos, começaram as demissões. Mas, com menos gente empregada, o consumo diminuiria. Resultado: as empresas não aguentaram e acabaram indo à falência.

    Assim que as primeiras notícias de falências chegaram à Bolsa de Valores de Nova York, os investidores começaram a vender suas ações, com medo de perder dinheiro caso as empresas das quais tinham ações falissem. Óbviamente, com o medo da falência, ninguém queria comprar ações. Mais uma vez, a oferta foi maior que a procura. Em 21 de outubro de 1929, as ações começaram a cair, e atingiriam o ponto mais baixo 8 dias depois, na chamada "terça-feira negra". Foi a Quebra da Bolsa de Nova York (também conhecido como "crack" ou "clash"). Após sucessivos erros em tentativas de recuperação, tinha início da Crise de 1929, também conhecida como a Grande Depressão.

    No ano que se seguiu, 20 mil empresas americanas faliram. Entre elas, a John Hill Wearing Company. Consequentemente, a empresa de meu bisavô, a Thompson & Rockmore American Fabric Industry, que vendia para a JH, também faliu. Ao receber a notícia e ver as condições em que os Estados Unidos se encontravam, Joseph Rockmore, assim como vários outros empresários, teve um infarto e morreu. Literalmente, Joseph morreu de susto.

    Era só o começo. Ainda no ano seguinte, 13 milhões de trabalhadores (25% do total) perderam seus empregos. Sem dinheiro, os americanos pararam de comprar produtos estrangeiros, o que alastraria a crise para o mundo inteiro. Meu bisavô, por exemplo, deixou de comprar café do Brasil. Na época, os Estados Unidos eram os maiores compradores do café brasileiro. Com o corte nas compras, o Brasil foi afetado pela crise. Além do Brasil, Alemanha, Austrália, França, Itália, Reino Unido, Canadá e Argentina também foram bastante afetados.

    A partir daí, cada país seguiu seu caminho para se recuperar da crise. Nos Estados Unidos, houve o New Deal. Em países como a Itália e a Alemanha, a crise reforçou os sentimentos nacionalistas da população, dando espaço para o fascismo de Mussolini e o nazismo de Hitler, que mais tarde gerariam outra guerra mundial.

    No Brasil, no Canadá e na Argentina, a Grande Depressão trouxe uma consequência positiva: a aceleração da industrualização, pois os agricultores passaram a investir na construção de indústrias.

    Quem se beneficiou da Crise da 29 foi a União Soviética. O país socialista estava imune às crises do capitalismo. Isso fez com que a ideologia socialista de popularizasse. Na França, por exemplo, as eleições de 1936 foram vencidas por um socialista.

    (continua...)